Desde quando você se entende por gente? Meu pai me disse uma vez: - Você se entende por gente depois dos sete anos de idade, quando você começa a lembrar das coisas.
Eu acho que foi isso que ele me disse. Eu me conheço por gente antes dos sete, mas não tenho certeza se são apenas coisas inventadas por uma criança que pintava o sete.
Itapeva? Moro lá desde que me conheço por gente, ou seja, desde a minha sexta ou sétima primavera.
Sim, nasci lá! Santa Casa. 30 de janeiro. 1991. CHOVENDO. Exato, como sempre.
Morei alguns anos fora, isso conta? Eu já era gente?
Itapeva da Faxina.
Desde que me conheço por gente eu tenho guardado datas boas nessa cidade. Tinha como época preferida aquela que começava em setembro.
Feriado preferido? 20 de setembro.
Desde que me entendo por gente eu amo esse feriado.
Podia ser um 20 de setembro chuvoso, como muitos foram. Dias em casa no sofá, pratos de domingo durante a semana, pais em casa, crianças em casa.
20 de setembro e muito sol, desfile na avenida.
Desde que me conheço por gente eu estava metida nisso. Minha mãe acordava cedo, prendia meu cabelo num rabo alto que todo mundo elogiava, meu pai me passava protetor solar e me obrigava a tomar água, muita água.
Ridiculamente eu passava fantasiada pela avenida principal, dando tchau para os pais mais babões do mundo.
AH, e depois? As tarde de 20 de setembro.
Podia ser uma tarde comendo doce no apartamento da tia Tata, o desfile na sacada.
Podia ser uma tarde toda na calçada da padaria. Toda a água que meu pai enfiou pela minha "guela" abaixo se transformava em cerveja pra ele. E alguma fantasia minha virava um sortido de sorvete, e meu pé encardido que só voltaria ao normal depois de uma semana de banho, caprichados banhos.
Feriados que deixaram marcas. Marcas de camiseta no braço, bochechas ainda mais coradas. Dias em que a noite eram mais longas, noites quentes e que podíamos ir pra cama mais tarde.
Feriado nosso, só nosso.
Feriado de discussão política, de bagunça, de sorvete. Feriados que eu nem sabia que gosto tinha a cerveja.
Eu quero um outro feriado com Legião no nosso rádio, com pai lavando o carro, com pratos brancos na mesa, com desfiles bregas e pés sujos, sorvetes caindo na roupa.
Desde que eu me entendo por gente eu morei lá. E agora acho que não me entendo por nada. Só me entendo por saudade.
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